sábado, 29 de dezembro de 2012

XXV – Ano Novo (Parte II)



Sônia voltou de viagem dois ou três dias depois e, cheia de saudades, logo levou Ariel embora. Quanto a mim, passava o tempo remoendo os últimos acontecimentos da minha vida. Além disso, a ausência de notícias sobre Leandra estava me consumindo. Até Nicole parecia desautorizada a me dizer qualquer coisa além de “ela está viva”.
– Pare de se preocupar, Yuri! – e pensei sentir até certa mágoa em seu tom. – Se ela se acha no direito de não lhe dar satisfações, você também não deveria dar tanta importância!



Não havia se encerrado a primeira semana do ano, quando uma visita tão inesperada quanto indesejada, apareceu em minha porta. Ele precisava ser tão insolente? Abri a porta já deixando clara a minha insatisfação.
– O que é que você quer? Eu não sequestrei a Léo! Não a estou mantendo em cárcere privado nem nada! Chame a polícia se duvidar!
– Eu sei que não... Eu vim em paz.
– Rá! – não consegui conter o espasmo sarcástico, mas Pedro não revidou, e continuou me encarando com seriedade.



Calei-me, então, para escutá-lo.
– Eu... Eu sempre achei que você é o homem que Leandra precisa na vida dela, e é exatamente por isso que nunca gostei de você. – era notória sua dificuldade em desenvolver aquele desabafo que jamais pensei um dia ouvir, no entanto ele parecia determinado. – É eu sei, é um tanto egoísta, mas não sou o tipo bonzinho.
Eu tentei interrompê-lo para dizer que discordava principalmente no que se referia a ser “bonzinho”, mas ele não me deixou.
– Eu agi errado, fiz um monte de bobagens e meti os pés pelas mãos. Sou cabeça quente, explosivo, ciumento, sou todo errado e você é o senhor perfeito.



Pedro estava equivocado novamente, porém decidi deixá-lo terminar.
– Mas acontece que eu também a amo, Yuri. Amo, e me dei conta de que não vou conseguir desistir de tê-la de volta, mesmo consciente de que não sou o melhor pra ela. Demorei muito para assumir esse amor, me faltava coragem entre outras coisas, mas não posso admitir perdê-la. O que posso te prometer é tentar não jogar sujo como você fez, se aproveitando do meu maior momento de fraqueza...
Eu não me aproveitei. Mas certamente não tentaria convencê-lo. Desnecessário e cansativo.




– É isso? Você terminou? – perguntei após um período de silêncio.
– Creio que sim.
– Certo. Então você já pode ir.
– Você não vai falar nada?
– Não há nada pra eu te dizer que você já não saiba, Pedro. E eu duvido que tenha vindo até aqui com alguma esperança de me ouvir dizer que abro mão de Leandra por você.
– É claro que não pensei isso. Nem vim pedir sua caridade.



– Pois é. – respondi apenas.
– Por que está nessa defensiva, então?
– Olha... eu estou cansado. Você já invadiu minha casa antes vomitando arrogância. Não é natural que eu adote esta postura?
– Ou talvez não tenha nada a ver a com a Léo? É por causa da Nina? Jura? – seu olhar debochado me deu enjoo.
– Já chega, Pedro! Não vou conversar com você sobre a Nina...



– Ah, é difícil, não é? Quando a situação é invertida...
– É melhor você calar essa boca!
– Está bem, está bem... – ponderou. – Eu disse que não vim pra brigar... Não me julgue um canalha por conta da Nina...
– Ah, não... Claro que não! – usei de ironia mais uma vez. – Por que eu faria isso?
– Novamente você está se dando uma importância maior do que deveria. Talvez eu estivesse errado sobre você, afinal. Não é muita presunção de sua parte achar que me aproximaria de Nina só para me vingar de você?



Não, não apenas para se vingar, mas também para isso, pensei. Mesmo assim optei pelo silêncio.
– Ok, Yuri. Eu vou embora. Juro que não venho mais até aqui sem ser convidado... Eu só precisava te dizer que... o que eu precisar aprender ou mudar para ter a Léo de volta, eu irei.
– Eu realmente não me importo com o que quer que você resolva fazer da sua vida. Se for a vontade da Léo, Pedro, você tem minha palavra que não ficarei no caminho.



Nina telefonou para se despedir e me convidei para acompanhá-la até o aeroporto. Senti-a reticente embora houvesse aceitado a minha oferta, e cheguei a pensar que Pedro já tivesse proposto o mesmo, mas ela estava só quando a busquei na casa de seu primo.
– Trevor não vai? – perguntei.
– Ele tinha outro compromisso...
– Compromisso?! O Trev?!
– Com alguma mulher, certamente... – ela sorriu.




A voz sensual no alto-falante anunciou a última chamada para Paris e Nina voltou seu olhar para mim.
– Bom... agora eu tenho que entrar mesmo... Como as coisas estão diferentes desde a última vez que estivemos aqui, não é? – ela observou.
Engoli saliva, talvez não tivesse sido uma boa ideia a minha. Eu a encarava de volta novamente mudo por não saber o que lhe dizer.



Nina sentiu meu desconforto e me abraçou.
– Desculpa, não foi minha intenção te deixar incomodado, é uma lembrança boa para mim, acredite.
– Não se desculpe. Está tudo bem... – movi uma mexa de seu cabelo para trás da orelha tentando disfarçar meu abatimento, nunca seria uma boa lembrança para mim.



Os olhos azuis voltaram a me fitar e antes que eu me movesse, Nina se pôs nas pontas dos pés, e alcançou minha boca em um beijo sereno. Eu não esbocei nenhuma reação. Não retribuí, nem rejeitei, mas o recebi em meio a uma miríade de impulsos elétricos se espalhando por minhas terminações nervosas.
Ofeguei, fazendo com que ela se afastasse. – Adeus, Yuri.



Nina desapareceu pelo portão de embarque e eu fiquei paralisado no mesmo lugar, tentando inutilmente assimilar o que havia acontecido, pois assim que recuperei a capacidade de mover meus músculos, ergui a cabeça para enxergar a imagem de Leandra, tão estática quanto eu. Há quanto tempo ela poderia estar ali, o quanto tinha visto ou ouvido? Inferno. Minhas pernas bambearam, minha garganta secou e provavelmente eu estava pálido.



Léo não precisou dizer nada, o semblante de decepção era suficiente para abrir um buraco em meu abdômen. O ar me faltou e desejei intimamente ter uma parada respiratória, apagar, e não abrir meus olhos nunca mais. Ela girou sobre seus calcanhares e se foi, e eu me deixei cair sob as poltronas do saguão, me autoflagelando na vã tentativa de acordar de um pesadelo.